domingo, 11 de maio de 2008

Dia das mães


Hoje é dia das mães. Para todos que vão comer aquela tradicional macarronada do domingo com aquela mulher que fez esforços para te colocar e te manter no mundo, boa sorte e cuidado com o molho de tomate na camisa branca!


Não se esqueçam de levar agasalho para não ficarem gripados, viu?
E se chover, guarda-chuva
E se doer, abraço
E se amar, cuidado


Feliz dia das mães para todos!

terça-feira, 6 de maio de 2008

A montanha mágica



Queria falar um pouco sobre o meu livro predileto: 'A montanha mágica' (1924) de Thomas Mann. Ele é um livro bojudo, daqueles que ficam em pé na parede. São 992 páginas de longas descrições e muita introspecção. Da primeira vez que tentei lê-lo, parei lá pela página 400. Desisti, mas depois de um ano tentei de novo e comecei da primeira página... Da segunda vez, eu consegui chegar ao final - depois de 6 meses. Foi como um namoro, quando terminei, a separação foi dolorida: uma lágrima rolou pela minha face e um pouco de sangue apareceu em minha garganta. Para entender esse último sintoma, é necessário conhecer a história do livro e de Thomas Mann (na caricatura ao lado).






O autor (1875-1955) é filho de um rico comerciante alemão e uma brasileira (!) e nasceu na cidade de Lübeck, no norte da Alemanha. Ganhou o Prêmio Nobel de Literatura em 1929 e é considerado um dos maiores romancistas do século XX. Sua inclinção à literatura é creditada à influência de sua mãe brasileira - Julia. Leia mais sobre Thomas Mann aqui .




*** AVISO: A LEITURA DO FINAL DESTE POST APRESENTA ALGUNS DETALHES DO LIVRO (spoilers). CONTINUE POR SUA PRÓPRIA CONTA E RISCO ***






'A montanha mágica' começa quando Hans Castorp, jovem alemão recém-formado em Engenharia, decide visitar um primo internado com tuberculose no sanatório Berghof, situado nos Alpes Suiços na cidade de Davos (foto acima). É bom lembrar que naquela época, um tratamento freqüente para os tuberculosos era a chamada terapia do repouso. As pessoas ficavam internadas nessas instituições chamadas 'sanatórios', geralmente localizadas na altitude das montanhas e passavam a viver isoladas da sociedade comendo, dormindo e seguindo uma rotina de exercícios leves. Castorp resolveu empreender essa viagem antes de começar um estágio num estaleiro em Hamburgo e seguir sua carreira profissional. A intenção inicial era ficar três semanas, mas ele tem sua saúde fragilizada a ponto de ser diagnosticado com tuberculose também, e acaba ficando internado lá por sete anos. Essa inesperada transformação de 3 semanas em 7 anos nos dá a pista de um dos temas centrais do livro: o tempo. No começo, há uma introdução, com o título 'Propósito', em que o autor conversa com os leitores. Leia:



"Não será, portanto, num abrir e fechar de olhos que o narrador terminará a história de Hans Castorp. Não lhe bastarão para isso os sete dias de uma semana, nem tampouco sete meses. Melhor será que ele desista de computar o tempo que decorrerá sobre a Terra, enquanto esta tarefa o mantiver enredado. Decerto não chegará - Deus me livre - a sete anos."


OS PERSONAGENS


A história ocorre antes da Primeira Guerra Mundial e vários personagens representam algumas posições políticas e ideológicas da época.

Hans Castorp representa o fascínio pela morte e pela doença. Com o personagem principal, Mann escreve sobre as tendências auto-destrutivas do ser humano, sobre a parte existente em cada um de nós que não quer fazer absolutamente nada e nos dirige à morte, ao repouso definitivo. Num trecho do livro, o personagem lembra quando foi reprovado antecipadamente numa matéria e sentiu uma extrema liberdade, pois poderia fazer o que quiser no resto do semestre. Castorp deixa-se levar por suas tendências até que tem uma experiência pessoal na montanha e realiza uma transformação alquímica. Nas palavras de Castorp:


"Para a vida há dois caminhos: um é o usual, direto e ajuizado. O outro é mau, ele passa pela morte e este é o caminho genial."




Nesse trecho fica clara a idéia do autor sobre a necessidade do contato com a experiência da doença e da morte no caminho para a saúde, o saber e a vida. Castorp percorre, durante o livro, uma trajetória que o leva da prosaica experiência burguesa da vida de um engenheiro para uma elevação moral, espiritual e sensual, simbolicamente representada por sua subida aos Alpes Suiços.






Settembrini, outro pesonagem importante, representa os ideais do Iluminismo, Humanismo, democracia, tolerância e direitos humanos. Em muitas situações, esse personagem encontra Castorp literalmente no escuro e acende a luz antes de seus diálogos. Ele tenta contrapor à visão mórbida de Castorp valores como a razão e o trabalho e o alerta sobre os perigos de sua atração pela doença, representada por uma paciente do sanatório Berghof chamada Madame Chauchat.





O antagonista de Settembrini chama-se Naphta. Ele é um jesuíta que representa as idéias do radicalismo e extremismo. É possível vislumbrar em seu discurso, elementos fascistas, anarquistas e comunistas. Ele é anti-capitalista e contrário à modernidade, liberdade, individualismo e progresso. Os diálogos entre os dois ocupam muitas páginas e mostram a tensão entre forças liberais e conservadoras na Europa antes da Primeira Guerra Mundial.







Claudia Chauchat, ou Madame Chauchat, é uma personagem que representa a tentação erótica, a luxúria e o amor, de um ponto de vista decadente e doentio. Ela é o principal motivo do prolongamento da estada de Castorp no sanatório. Mann representa aqui a promessa feminina de prazer sexual como uma poderosa motivação para as ações masculinas. Até seu sobrenome em francês significa "gata quente" - chaud chat. Sua aparência física lembra a de uma gata, com seus olhos oblíquos de quirguiz - povo asiático.





Mynheer Peeperkorn, que entra na história posteriormente, é o novo amante de Madame Chauchat e representa o espírito Dionisíaco. É um personagem com extrema força vital e enorme ingenuidade. Ele tem ares de importância, é uma figura poderosa e estranha com seu hábito de nunca completar as frases.





Um dos médicos principais é o chamado Dr. Krokowski, que representa as idéias da nascente Psicanálise no começo do século XX. Ele dá alguns seminários no sanatório sobre essas idéias e escandaliza a todos falando abertamente sobre sexo e sua importância em nossa vida mental, física e afetiva.








Voltemos a um dos principais temas do livro: o tempo. Logo no começo, ao narrar a chegada de Castorp a Davos-Platz, Mann escreveu sobre a relação entre o tempo e o espaço:




"Dois dias de viagem apartam um homem - e especialmente um jovem que ainda não criou raízes firmes na vida - do seu mundo cotidiano, de tudo quanto ele costuma chamar seus deveres, interesses, cuidados e projetos; apartam-no muito mais do que esse jovem imaginava enquanto um fiacre o levava à estação. O espaço que, girando e fugindo se roja de permeio entre ele e seu lugar de origem, revela forças que geralmente se julgam privilégio do tempo; produz de hora em hora novas metamorfoses íntimas, muito parecidas com aquelas que o tempo origina, mas em certo sentido mais intensas ainda. Tal qual o tempo, o espaço gera o olvido; porém o faz desligando o indivíduo das suas relações e pondo-o num estado livre, primitivo; chega, até mesmo, a transformar, num só golpe, um pedante ou um burguesote numa espécie de vagabundo. Dizem que o tempo é como o rio Letes; mas também o ar de paragens longínquas representa uma poção
semelhante, e seu efeito, conquanto menos radical, não deixa de ser mais rápido."




Até na estrutura de seu livro, Mann representa a ambígua relação do ser humano com o tempo. Apesar de empregar a ordem cronológica para narrar a história, sua obra é assimétrica. Nos primeiros cinco capítulos, ele descreve o primeiro dos sete anos de Castorp no sanatório com uma minúcia extrema. Aos outros seis anos, marcados pela monotonia e rotina, ele reserva apenas dois capítulos. Em outra parte do livro, o autor diz que quando realizamos atividades rotineiras, pequenas unidades de tempo, como o dia, parecem passar muito devagar, e, ao mesmo tempo, mal nos apercebemos da passagem das grandes unidades de tempo, como meses e anos.


É isso aí! Espero ter deixado todos curiosos para empreender o projeto de ler este livro! Se tiverem tempo...

Tédio





Quem nunca se sentiu assim? Parece que o tédio é uma falta do que fazer carregada de angústia. É uma falta de interesse por qualquer tipo de atividades. Talvez o tédio seja justamente o oposto da motivação. Eu chego em casa e milhares de possibilidades desenrolam-se diante de mim. Televisão, rádio, livros, trabalho, pessoas, telefone, internet. Quanto mais possibilidades, mais intenso é o tédio.



Muitas pessoas rejeitam o tédio, ou até negam esse sentimento. Ele é comumente visto como um sentimento negativo, como se algum sentimento pudesse ser instrinsecamente bom ou mau. Na verdade, o tédio e a motivação são partes do mesmo processo, duas faces da mesma moeda. Escrever sobre tédio, para mim, está sendo bastante motivante neste momento.




Pesquisando pela internet, acho um livro de um norueguês chamado Lars Svendsen chamado "A filosofia do tédio". No primeiro capítulo ele compara o tédio com a insônia: ambos são estados em que o "eu" se dissolve na noite eterna de um vazio infinito. Quando temos insônia e ficamos na cama estamos num estado que não é a vigília e nem o sono, uma espécie de limbo existencial. O tédio não possui um caráter muito claro, é um estado emocional bastante fluido. Por isso, muitas pessoas não conseguem percebê-lo claramente. Há pessoas que dizem que nunca sentiram tédio em toda sua vida. Será possível? Transcrevo, a seguir, uma passagem do livro em que Svendsen cita George Bernanos em seu livro "Diário de um cura de aldeia":




"Eu me dizia, assim, que os homens são consumidos pelo tédio. Naturalmente, temos que refletir um pouco para perceber isto – não é coisa que se veja de imediato. É uma espécie de poeira. Vamos para cá e para lá sem vê-la, a aspiramos, a comemos, a bebemos, e ela é tão fina que nem sequer range entre nossos dentes. Mas basta pararmos por um momento, e ela assenta como um manto sobre nosso rosto e nossas mãos. Temos de estar a sacudir constantemente de nós essa chuva de cinzas. É por isso que as pessoas são tão agitadas."





Outra questão importante: para que serve o tédio? Quando o tédio é profundo e decidimos encará-lo de frente, parece que alguma ação se torna inevitável. Ou seja, o tédio seria o mecanismo através do qual conseguimos uma mudança na rotina. Nesse sentido, ele seria essencial para estimular a variabilidade de novos comportamentos. Por que os portugueses começaram a explorar o Novo Mundo no século XVI? Eles não tinham nenhum estímulo para isso: a viagem era demorada, perigosa, ainda não haviam sido encontrados metais preciosos e havia tribos de índios canibais por aqui. O que os moveu para essa empreitada? Só pode ser o tédio que sentiam em Portugal naquela época!




Brincadeiras à parte, existem diferentes tipos de tédio: situacional e existencial. O primeiro ocorre em situações específicas quando não podemos fazer o que queremos ou quando não queremos fazer o que estamos fazendo. Já o tédio existencial ocorre quando não temos a menor idéia do que queremos na vida, há uma perda geral dos significados, o que gera a chamada angústia existencial. Por que estamos aqui? Qual é o sentido da vida? O que acontece quando morremos? Essas perguntas moram no fundo da alma humana e permeiam nossas vidas de forma silenciosa, na maioria das vezes. A função desse tipo de tédio pode ser justamente o despertar da consciência sobre a existência e da responsabilidade que temos pela vida que levamos. Não estou querendo aqui ignorar os fatores sociais, culturais e históricos, mas nossa vida é marcada por escolhas incessantes a todo momento. Nossas decisões afetam sobremaneira o curso de nossas vidas, tanto quanto os outros fatores mencionados.




Uma questão histórica: será que o tédio está aumentando em nossa sociedade pós-moderna? Isso nunca será respondido cientificamente, pois não há uma maneira objetiva de se medir o tédio de uma população. Mas o uso intensivo da televisão, por exemplo, não seria um ótimo indicador de tédio? Por que alguém passaria as poucas horas livres que possui na frente de um aparelho de TV? Para passar o tempo. Para não perceber o tédio presente em sua vida. E por que algumas pessoas ocupam todo o seu tempo com as mais variadas atividades, de modo a diminuir seu tempo ocioso a quase zero? Será uma forma desesperada de evitar esse contato com seu próprio tédio existencial? Até os ditos populares mostram essa idéia: "mente vazia, oficina do diabo". O que é esse medo tão grande que as pessoas têm do vazio, do não fazer nada? Será que quando estamos mais inativos, somos confrontados de forma mais direta com nossos sentimentos, fantasias, pensamentos? Isso pode assustar os mais desavisados... Fernando Pessoa em seu Livro do Desassossego faz uma interessante análise da relação entre o tédio e o ócio:




"Não é o tédio a doença do aborrecimento de nada ter que fazer, mas a doença maior de se sentir que não vale a pena fazer nada. E, sendo assim, quanto mais há que fazer, mais tédio há que sentir."



Mais adiante, Svendsen analisa a relação entre tédio e a falta de significado. Vivemos num mundo onde tudo chega completamente codificado até nós. Tudo é estudado, tudo é explicado, tudo é controlado. O mundo torna-se entediante quando tudo é transparente. O interesse pela violência divulgada pela imprensa sensacionalista é um bom exemplo de como algo misterioso, sem explicação pode ser tão fascinante. Pode nos levar a tempos antigos onde fadas, gnomos, ogros e deuses habitavam as vidas das pessoas como expressões legítimas do mistério. Hoje esse tipo de mistério faz sucesso no cinema, mas sabemos que tudo é falso e quando sairmos do filme, voltaremos a nossa vida protegida e explicada.

domingo, 4 de maio de 2008

O início de um caminho


Para inaugurar este blog, quero que torrentes mentais invadam a tela deste computador. Comecemos com o objetivo disto aqui: quero mostrar ao mundo um pouco do que é ser Arnola Menezes. Prometo ir fundo e levar as pessoas ao caminho sem volta do conhecimento, da educação e da formação pessoal Humanista (nem sei se esse é o termo adequado, mas é o que vou utilizar neste começo).
Por que Humanista? Porque o meu interesse principal é compreender de maneira cada vez mais abrangente o que é ser humano. Para isso, vou começar com o único material a que tenho acesso: minhas percepções, afetos, memórias e sonhos. A idéia é simples: vamos analisar o particular para tentar chegar no geral, começar pelo indivíduo até chegar à espécie, do interior ao exterior.

Convido você, seja você quem for, para entrar nessa viagem comigo. Mas volto a advertir: conhecimento pode causar dependência!